quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Jazz em mim

Jazz em mim.
Escrevo no peito contorno, morno
o epitáfio indelével, letra a letra bordado.
D’entre sépias flores secas, o adorno
dum beijo morto ao nascer, porque dado.
Jazz em mim, assim
numa imagem nascida dum cheiro,
numa dança que os sentidos engane,
escorrega-nos, licoroso, um gole de Coltrane.
Jazzas-me, pois, tão bem, homem inteiro.
E o gotejar e o chover palavra e gesto
em compassos delicados doces de quente.
Abraças-me, ampla, à mulher e ao resto
que na cadência te quer, te olha, te sente.
Jazz...
Assim creio: o teu corpo perece
no desfalecer e pele de nós liberta.
Sou! A terra que agradece
a vinda de ti em luz descoberta.
Jazz em mim. Sim?
Sulca-me de dedos as rugas, fugas
dos corpos nossos já sepultados.
Escavamo-nos. Recusa o ar que ainda sugas
que voz e cântico és, cinza e pós misturados.
Jazz em mim.
Assim.
Suspiros no ouvido em si bemol;
velam-se os mortos no vivo lençol.
Cessa, é finda a música. Schhhh... Devagar...
Não acordes agora. Embalo de repousar...
Jazz em mim. Assim...

para T., que me percebe e conhece.

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