segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

último pensamento antes de entrar nos 30 anos:

Weeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! ;)))))

domingo, 30 de dezembro de 2007

mas que ASAE do caraças!

Termino este ano de 2007 com uma mensagem de profundo desagrado: quem foi a alminha que um dia se lembrou de colocar sensores em vez de interruptores nos wc's de restaurantes e cafés? Estou cansada de fazer aeróbica de cada vez que preciso de fazer um chichi, para que a porcaria do sensor dê pela minha presença... Pois, estas coisas que causam mal-estar ao cliente é que deveriam ser da competência da ASAE...

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

poetas da madrugada

Entro. Subo e sorrio pelas escadas.
“Podia viver aqui” – digo-me; avanço
em busca de ti nas demais entradas.
Encontro-te: as palavras, o descanso.
“Não jantei ainda. Quero um copo de vinho.”
Paredes, salas imensas, corredores,
perdemo-nos, rimos, inventamos caminho
no humano tráfego, nesta ilha dos amores.
Música, vozes, gravidades: são vinte e uma
as rítmicas em choque simultâneas.
Sensoriais, gente que dança e bebe e fuma
sem ontem ou amanhã: mutações espontâneas.
E a noite cai, de lábios carmim,
Abafado, o som pelo prédio ecoa.
Descubro-te absorto: observas-me assim.
E murmuras: “És a mulher mais bonita de Lisboa.”
“Tenho fome! E o vinho que termina...”
Seguimo-nos pelos corpos tantos,
escapamos aos acenos – Lisboa, moça, menina –
nela nos esquivamos: pelas esquinas, pelos cantos.
Degraus abaixo, cruzamos a porta
penetramos a noite fria de mão dada.
Um beijo, um abraço. E a avenida que é morta
vive agora, em nós, poetas da madrugada.

calmaria

O vento passa por entre os pinheiros
Num sopro suave, dança, ao entardecer
Púrpuras, as nuvens, são como veleiros
Navegam em mar de céu de vista a perder.
Sossega, criança, a noite desprende devagar
Há caruma aos pés, musgo fofo de almofada
Bolotas e cogumelos, frágeis teias d’encantar.
Faz um barco de carcódia, partes com a alvorada.
Acolá, uma rã mergulha nas águas quietas
Cobertas de ervas e limos. E mais duas que saltam!
Mil cores reflectidas: libélulas de asas abertas
São as princesas que nesta história faltam.
Com folhas de castanheiro faço uma coroa bela
Sou a rainha orgulhosa deste pedaço de terra
Tenho um exército de bugalhos e uma espada amarela
Corro atrás dum gafanhoto e declaro-lhe guerra.
Toca uma orquestra inventada pelas ladeiras
Os muros passados a salto, em ritmos ermos
São entraves breves – há mil e uma maneiras
De viver outras vidas: basta querermos.

natal n'aldeia

Serve-se o silêncio à mesa
Em travessas regadas de azeite.
Fumegam as couves, a candeia acesa
O frio de nós: um doloroso enfeite.
Os copos de vinho cheios, tinto
No lugar onde abraços deveriam.
Somos poucos e demasiados – sinto
Que paz e amor há muito partiram.
Passa-me as batatas, tu, o bacalhau
O pão já partido, fatias de broa.
“O vinho escorrega bem, não é nada mau!”
E, mal disfarçada, a mágoa de sempre ecoa.
Polvilham-se de açúcar os dizeres
Na esperança (vã) dum Natal sereno.
Desde q’haja comeres e beberes,
As boas festas cospem-se num costume ameno.
São poucos à mesa – tanto faz menos ou mais
Pesado o ar, custa respirar, sufocamos
Presos em memórias de figuras ideais.
Levanta-se a mesa: nós não nos amamos.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

o comprovativo de morada

Há coisas que, por muito boa vontade que tenha, não consigo compreender. Uma delas é o comprovativo de morada. Tomemos o seguinte exemplo:

Senhora ao balcão da TMN: Muito bem, agora só preciso dum comprovativo de morada...
Eu, apontando para a as condições de adesão a um certo serviço de Internet: Comprovativo de morada? Mas aqui só dizia para apresentar a carteira profissional e o BI...
Senhora da TMN: Sim, mas para fazer o contrato preciso dum comprovativo de morada ou da carta de condução.
Eu, já a ficar impaciente: Mas eu não conduzo. E não costumo andar com as contas da água e da luz na mala depois de as pagar... Podiam ter avisado. Então e não tem aí a minha morada no sistema?
Senhora da TMN: Não, porque a senhora tem a opção de carregamentos...
Eu, revistando furiosamente tudo o que é livro, agenda, carteira, em busca de uma conta ou carta qualquer, sem sucesso: Então e não posso levar já hoje o equipamento? Amanhã de manhã venho cá entregar o comprovativo... Pode acreditar em mim, eu sou boa pessoa! (Se fosse um gajo ao balcão, já o tinha conquistado com duas ou três piscadelas de olhos, de certezinha!)
Senhora da TMN, com ar de funcionária de repartição de finanças: Não, porque é preciso ter a sua morada para poder fazer o contrato...
Eu, suplicante: Mas eu digo-lhe a minha morada. E até ligo para uns quantos amigos para que confirmem que moro aí... Olhe, tenho aqui o cartão de eleitor, que diz "Junta de Freguesia de Alcântara". Serve?
Senhora da TMN: Não.
Eu: Chuinf...

Nota: Ligue-se à Internet em qualquer lugar? Pois sim... Se eu fosse sem-abrigo e não tivesse um comprovativo de morada - para alguma coisa positiva as contas tinham de servir, afinal... - queria ver se me podia ligar à Net no meu banco de jardim...

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

duchamp tuga

Andamos em obras no local onde trabalho. Podiam mandar o pessoal para casa, mas nããããããoooooo... Para além do incómodo que é escrever ou falar ao telefone enquanto secretárias são arrastadas e paredes são raspadas e pintadas, há coisas que não se fazem a ninguém: levaram o urinol da casa-de-banho dos homens! Tenho para mim que um dos empreiteiros com mania que é o Duchamp o levou, à laia de "ready made", para fazer um centro de mesa para a ceia de Natal. De qualquer forma, já incitei os meus colegas masculinos à revolta: "Ei, gajo, não sejas mole, devolve-nos o urinol!"...

Jazz em mim

Jazz em mim.
Escrevo no peito contorno, morno
o epitáfio indelével, letra a letra bordado.
D’entre sépias flores secas, o adorno
dum beijo morto ao nascer, porque dado.
Jazz em mim, assim
numa imagem nascida dum cheiro,
numa dança que os sentidos engane,
escorrega-nos, licoroso, um gole de Coltrane.
Jazzas-me, pois, tão bem, homem inteiro.
E o gotejar e o chover palavra e gesto
em compassos delicados doces de quente.
Abraças-me, ampla, à mulher e ao resto
que na cadência te quer, te olha, te sente.
Jazz...
Assim creio: o teu corpo perece
no desfalecer e pele de nós liberta.
Sou! A terra que agradece
a vinda de ti em luz descoberta.
Jazz em mim. Sim?
Sulca-me de dedos as rugas, fugas
dos corpos nossos já sepultados.
Escavamo-nos. Recusa o ar que ainda sugas
que voz e cântico és, cinza e pós misturados.
Jazz em mim.
Assim.
Suspiros no ouvido em si bemol;
velam-se os mortos no vivo lençol.
Cessa, é finda a música. Schhhh... Devagar...
Não acordes agora. Embalo de repousar...
Jazz em mim. Assim...

para T., que me percebe e conhece.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

este não é um post nacionalista, mas...

Fico deveras preocupada quando esta juventude (leia-se, um amigo com poucos anos de diferença de mim) reconhece num ecrã de cinema referências a "O Sétimo Selo" de Ingmar Bergman, mas não reconhece, numa cena caricatural, uma fotografia de Salazar pendurada numa parede. Há cultura, há cultura, mas cheira-me a impostura...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

não me interrompam quando estou a mexer em filtros do excel!!!

- Estou sim, muito boa tarde. É a senhora Laura...?
- Sim, boa tarde... Quem fala?
- Fala XXXX da Tv Cabo, como está?
- Outra vez? Mas quantas vezes é que já vos disse para não me ligarem para o trabalho?
- Errr... Não tenho aqui nenhuma indicação nesse sentido...
- Ouça, já vos pedi mil vezes para me ligarem para o telemóvel e não para o trabalho. Escreva aí, se faz favor: "ligar sempre para o telemóvel e nunca para o trabalho".
- Muito bem, vamos ter essa indicação em conta...
- Mas afinal, diga lá o que quer...
- Estou a ligar para lhe falar das nossa promoções no serviço de telefone...
- Ah, muito bem... Mas olhe, eu não tenho telefone fixo!
- Ah, não tem? Hum, estranho, aqui diz que tem...
- Não tenho e não quero ter... Por isso, desculpe lá, mas escusa de estar a gastar o seu tempo... Ah, e da próxima vez, por favor, ligue para o telemóvel!
-....


Aos senhores da TV Cabo, peço desculpa pela minha rispidez... Não é nada pessoal! Prometo ser mais simpática a partir do momento que passarem a ligar-me para o telemóvel. É que, ainda por cima, não costumo atender chamadas não identificadas... ;))))

as coisas que esta gente diz...

"Pá, a Laura tem uma capacidade incrível de escrever sobre nada... Tu pedes-lhe para escrever sobre o ar e pimba!, tens 4 mil caracteres!"

Ehehehe...

sábado, 15 de dezembro de 2007

(re)conhecimento


És o meu outro lado do espelho.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

acende-me um cigarro

Consome-me.
Como quem fuma um cigarro
e deixa o fumo entranhar-se na pele.
Arrepia-me.
Deixa os teus lábios sugar o que de mais puro em mim há.
Sua. Geme.
Com os olhos postos no vazio que existe em ti.
Deixa-te cair.
[8.8.05]

Acende na tua boca o cigarro
num beijo percebido
de fumos trocados
e salivas combinadas.
Fumo a tua saliva.
Sabes-me.
Fumo-te deveras
Na ânsia da última passa
da noite.
De uma noite.
Nos lábios teus o aroma
de um queimar lento
e crescente.
E crescente...
Apago o cigarro
E aguardo, com olhos grandes
e um silêncio de luz
que me dês o próximo beijo
de nicotina.
[13.12.07]

sorriso de pudim

"As pessoas não dizem vezes suficientes a palavra pudim."


foto de rspiff emprestada daqui.

Obrigada, rspiff, meu "irmão adoptado", por teres plantado um sorriso largo e terno no meu rosto com esta afirmação.

Vou passar a dizer mais vezes "pudim". Tantas quantas digo "caruma"...

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

sopa altamente calórica

Os meus hábitos alimentares dificilmente poderão ser designados de "hábitos". Quero com isto dizer que, da mesma forma que num dia devoro um suculento cozido à portuguesa ou uns carapauzinhos com açorda, alturas há em que passo em branco a hora de almoço ou me fico com uma sopa de "hortalisa", como vi há pouco anunciado. O hábito não faz a manjedoura, ou qualquer coisa do género...
Isto para dizer que hoje foi um daqueles dias em que almocei em 10 minutos: "Boa tarde, senhor Avelino. É uma sopa e uma empada de galinha, se faz favor..." E abençoado seja o meu auto-controlo! Gostava de saber quem foi a alminha que, um dia, teve a “linda” ideia de criar balcões de vidro. É certo que é um regalo para a vista entrar numa pastelaria ou restaurante e dar de caras com todas aquelas iguarias maravilhosas, que são também um “regalo” para as ancas e para o rabo de muita gaja que por aí anda...
Felizmente, posso dar-me ao luxo de comer todas as gulodices que quiser, já que, como descobri recentemente, as calças do tempo da escola secundária ainda me servem! Mas não é isso que está em causa. O que está em causa é que não é bonito, para alguém que está de pé, ao balcão, de cara metida na sopa, olhar para a superfície onde repousa a malga e... ele é tortas com creme e pastéis de nata, bolas de berlim e tarletes de mil cores, queques de sabores vários e tacinhas de pudim, bolos folhados e delírios de chantilly...
Ou seja: eu posso ter comido apenas uma sopa, mas os meus olhos devoraram uns belos milhares de calorias!!! Ainda bem que os olhos também comem, mas não engordam...

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

escrever amor


enruga-te em torno dos meus olhos

Grita o teu corpo pelo meu
“Ouves?”
“Ouço.. Schhhh!! Deixa ouvir...”

Se fechar os olhos estás
Aqui comigo.
Ouço a tua pele gritar e o meu corpo
Dança para ti.

Suamo-nos.

Continuo de olhos fechados
E abraço-te.
És o meu poema de rimas ausentes.
Sou escrever para ti
Vamos?
Lambuzarmo-nos de palavras.
Foder como quem escreve
Escrever como quem fode.
Contigo. Para ti.

“Sentes?”
“O quê?”
“O silêncio que vejo aqui da janela...”
“Sim, sinto. Vejo a mesma noite
e as mesmas estrelas que tu”

Trazes as palavras à flor
Da pele.
Quando me descubro, em ti,
Todas as palavras se soltam.
E já não sou eu
Mas um poema
Moldado pelos teus dedos.

Saudade.
Toda.
Todo.
Tanto. E mais tanto...

“Escreve palavras no meu corpo”
Escrevo sim.

“Sou o teu caderno”
Abro-te, em gesto delicado.

“Usa-me!”
Sempre e sempre. Tanto.
Suave saudade eternidade eternecidade efemeracidade
Tanto, tanto!

Mordo a maçã suculenta e verde
E é a tua carne
E és tu nos meus lábios.
Polpa, língua, desfaz-se
Sem pecado, só prazer.

“Ouves o meu corpo gritar por ti?”

Traço a minha caligrafia tremida
Nos recantos de ti.
Faço da tua pele o meu caderno, vinco-te letras
Doces ou impulsivas
Na medida do prazer.

Vou, assim, escrevendo amor contigo.
Quero, assim, foder amor contigo.

“É teu, tão teu...”

domingo, 9 de dezembro de 2007

gostar de palavras

"Estendo o pé e toco com o calcanhar numa bochecha de carne macia e morna; viro-me para o lado esquerdo, de costas para a luz do candeeiro; e bafeja-me um hálito calmo e suave; faço um gesto ao acaso no escuro e a mão, involuntária tenaz de dedos, pulso, sangue latejante, descai-me sobre um seio morno nu ou numa cabecita de bebé, com um tufo de penugem preta no cocuruto da careca, a moleirinha latejante; respiramos na boca uns dos outros, trocamos pernas e braços, bafos suor uns com os outros, uns pelos outros, tão conchegados, tão embrulhados e enleados num mesmo calor como se as nossas veias e artérias transportassem o mesmo sangue girando, palpitassem compassadamente silenciosamente duma igual vivificante seiva.
[...]
Somos cinco numa cama. Para a cabeceira, eu, a rapariga, o bebé de dias; para os pés, o miúdo e a miúda mais pequena. Toco com o pé numa rosca de carne meiga e macia: é a pernita da Lina, que dorme à minha frente. Apago a luz, cansado de ler parvoíces que só em português é possível ler, e viro-me para o lado esquerdo: é um hálito levemente soprado, pedindo beijos no escuro que me embala até adormecer. Voltamo-nos, remexemos, tomados pelo medo de estarmos vivos, pela alegria dos sonhos, quem sabe!, e encontramos, chocamos carne, carne que não é nossa, que é um exagero, um a-mais do nosso corpo, mas aqui, tão perto e tão quente, é como se fosse nossa carne também: agarrada (palpitante, latejando) pelos nossos dedos; calada (dormindo, confiante) encostada ao nosso suor."
*



*Excerto de "Comunidade" de Luiz Pacheco


Estou à beira de mudar de década. Daqui a 22 dias faço 30 anos e estou tranquila. Não sei como vou passar a noite, tão pouco o que farei durante o dia. Talvez entre no novo ano apenas na minha companhia, mas estou serena. Os últimos anos não têm sido fáceis, mas lentamente vou conquistando, finalmente, a paz de espírito de que necessito. Pesem embora as feias e indeléveis cicatrizes que me enfeitam o corpo e os gestos - como diria alguém que conheço, as cicatrizes (as físicas, mas penso que se pode dizer o mesmo das outras...) são "marcas da vida, sinais bonitos, um mapa alternativo do corpo, tatuagens involuntárias" - gosto da vida que fiz para mim.

Estou à beira de fazer 30 anos. E sei que vou gostar de os ter. Se os vou celebrar? Talvez, mas em silêncio. Com um bom vinho e um sorriso largo. A guerra tem sido dura, mas já levo a vitória em algumas batalhas, sei-o. Para ti, homem que foste meu, que prometeste estar comigo nesta altura e em todas as outras e não estás: tenho pena. Poderia ter sido para o resto da vida. Não foi. Já parei de chorar por ti. Demorou alguns anos, o luto. Foi preciso travar graves lutas comigo e com outros, mas parei já. Cresci muito. Muito mesmo. Mais do que já havia crescido antes de ti. E lamento que não estejas por perto para ver e admirar a mulher que me tornei.

Estou à beira de fazer 30 anos. E apesar de hoje ter visto um presente que gostava de receber - a obra "Comunidade", com texto de Luiz Pacheco e pinturas de Cruzeiro Seixas - o preço é absolutamente proibitivo para mim, jornalista tesa, e para todos os meus, muitos deles, igualmente jornalistas tesos (afinal de contas, a minha livraria preferida ainda continua a ser a Feira da Ladra)... A não ser que consiga negociar com o banco o não pagamento de duas prestações do meu crédito à habitação. Passaria a viver, literalmente, debaixo da ponte, mas com a obra de Luiz Pacheco para me dar alento.

Sonhos à parte, estou à beira de fazer 30 anos. E se algum dos meus amigos, amigas, leitores e admiradores (eheheh... pois sim!) quiser surpreender-me e fazer-me sorrir no dia em que mudo de década, é simples: é oferecer-me um exemplar de "Comunidade", não da edição de 750 euros, mas uma qualquer edição. Não é fácil, dada a raridade do livro. Mas pelos excertos que consegui ler aqui e ali, é daquelas obras que nos fazem gostar ainda mais de palavras. E como eu gosto de gostar de palavras...


sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

a dor escondida

Com vergonha, não tiro o casaco, para não se ver as marcas no braço... Ele não fez por mal, digo para mim própria, para me tentar convencer de um amor qualquer. Ele não vai voltar a fazer-me isto, repito. A conversa matinal é igual a tantas outras no passado.
- Então, que se passa com o teu braço?
- Hum... Dei um mau jeito ontem à noite...
- Não me mintas. Foi ele outra vez, não foi?
- Foi... Mas foi a última vez. A sério que foi!
- Ouve, é sempre a última vez. Até que volta a acontecer... Vivem juntos há cinco anos, já é mais que tempo de ele te respeitar!
- Mas ele ama-me! Eu sei que ele me ama...
- Isso é um amor doentio, então... Ouve, não achas que está na altura de procurares ajuda?
- E o que é que queres que eu faça? Que o deixe? Que o abandone? Eu sei que ele não pode viver sem mim...
- Tu mereces melhor. Como é que uma pessoa como tu se pode deixar magoar e manipular dessa forma? Um dia ele pode magoar-te a sério. E depois como é que vai ser?
- Que queres... Eu amo-o!...

Após um terrível ataque felino cujos pormenores me vou abster de descrever, não sei se chore por causa dos arranhões, das dores e do inchaço no antebraço; ou se ria, por causa do ridículo que é estar no trabalho com o braço todo pintalgado de betadine... O que vale é que só me dói quando escrevo...


quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

"é pedal, é pedal... tralálálálá..."

Saio de casa em piloto automático. Café, preciso de café... Desço as escadas com trejeitos de malabarista, de bicicleta "a tiracolo". Calço as luvas, enfio o chapéu na cabeça e sinto os primeiros ares da manhã a acariciar-me a cara. Mochila às costas, olho para trás, cautelosa. Não vem nenhum. Crio um impulso, piso o pedal direito, começo o sincronismo corporal que me leva até ao trabalho. Mais adiante cruzo-me com o 15. Vem decorado com luzes e, aos comandos da máquina, um Pai Natal de longas barbas lança um aceno na minha direcção. Tlem! Tlem! Tlem! Sim, é a ti que estou a acenar! Tlem! Tlem! Tlem! Devagar, a mão esquerda larga o volante da bicicleta. E, como se o braço estivesse ligado por linhas invisíveis aos meus lábios, enquanto os dedos respondem ao cumprimento, no meu rosto desenha-se o primeiro sorriso do dia. Não será o maior sorriso do dia, sei-o, mas é, sem dúvida, um dos mais preciosos.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

planeta borboleta

Escreve-se, cru, o verbo sujo
Atira-se com um substantivo
Rasgado na pele. Do peso fujo.
Estamo-nos, tenho-te cativo.
Uma aurora a crescer, boreal
Alimenta os olhares de luz,
E lambemos o suor, sabor carnal
Cegos pelo verbo que nos conduz.
Habita-me, somos um planeta
De rosas e acasos e risos e luas.
Vês, acolá, uma borboleta?
Agarra-a. É para ti. É tua.

mi casa es su casa :)



Já tive três polacos, um alemão, duas japonesas, uma finlandesa e um russo.
Quantos mais, melhor!

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

côdea


foto de SR

Dou-te a côdea, é tua.
Toma-a nas mãos. Come.
Enquanto segredamos à Lua
Aquela que é a nossa fome.
Parte-a em pedaços
Leva-a, quente, à boca.
Sôfregos são os abraços
Vem, que a noite é pouca.
Dou-te a côdea, devora.
Passa devagar ao miolo
Esquece a demora da hora
Dá à tua fome consolo.

domingo, 2 de dezembro de 2007

pai natal à pequim

Chego a casa após um fim-de-semana fora e deparo-me com o seguinte presente: um cartaz com um Pai Natal colado na parede entre o meu apartamento e o da minha vizinha da frente. Este não veio da Lapónia. Por sinal - e a julgar pelos caracteres pequeninos no canto inferior direito - veio directamente da loja de chineses lá da rua.
Se os meus vizinhos gostam de pendurar renas e bonecos de neve nas respectivas portas, fantástico. Eu, na minha porta, só gosto de pendurar as contas que ainda estão por pagar, e do lado de dentro de casa, de preferência.
Que diabo! Não percebo porquê toda esta histeria com o Natal, especialmente, quando ainda falta tanto tempo. Ninguém começa a pendurar coelhos da Páscoa nas portas ou a vender na rua cravos da revolução com três semanas de antecedência, caramba! Felizmente, este ano não tenho de levar com a árvore e a música do "Feliz Navidad" em loop na Praça do Comércio, enquanto espero pelo eléctrico.
Não me interpretem mal. Eu até gosto do Natal... Mas no dia 25 de Dezembro! Pronto, 'tá bem, e na véspera... Mas vai tudo dar ao mesmo. Ou seja, durante 23 dias vou ter de levar com a carantonha barbuda à minha porta. O que me leva a pensar em tomar algumas precauções... Convém não beber muito por estes dias, ou ainda apanho um valente susto ao subir as escdas e começo a dar murros na parede, julgando tratar-se dum ladrão...
Bom, resta-me tentar descobrir quem foi a "gentil" vizinha que teve a "amabilidade" de decorar desta bela forma a entrada de minha casa. E posso sempre devolver o Pai Natal chinês alegando que sou judia e que celebro o Hannuka . Sempre quero ver o que é que me vão depois colar na parede...